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Onde nasce um Psicanalista?

Por Kelly Ruivo

          Uma hipótese a esta resposta, diria que é no divã que nasce um psicanalista, no seu inconsciente, diante da angústia que experimenta na busca em si próprio e no outro.

          Engana-se quem vê o psicanalista como um sujeito possuidor de si, o ser psicanalista — se é que existe posse de algo nesta posição — trata-se da falta que ele ocupa na função do Sujeito Suposto Saber, que dirige o tratamento. Nasio em seu livro “Como Trabalha um Psicanalista” escreve “Com Lacan, diríamos: ocupar o lugar do semblante do domínio, isto é, o lugar do semblante da direção, o semblante de ser o mestre, sem esquecer que se trata apenas de um semblante“.

E por que só um semblante?

          Porque é nesta posição que ele será atravessado pelo discurso que talvez seja a verdade dita pelo analisando. Discurso este que faz com que o psicanalista possa ocupar um lugar que não é dele, mas do aparente domínio da falta do analisando que é depositada no psicanalista, ao qual o psicanalista é o interlocutor e não possuidor.  

          É neste esvaziamento de si do psicanalista, que se produz o desejo de fala do analisando, que fala sobre o desejo de preencher esta falta, que ele supõe que é de domínio do psicanalista. O que é para Lacan o furo encoberto pelo véu em que o psicanalista ocupa como posição de “objeto fálico” e que se faz enigmático, por que se apresenta entre o simbólico e o real.

          O psicanalista que cai no erro de achar que tem autoridade para orientar ou dirigir um tratamento está em resistência. A resistência do psicanalista interrompe e deixa de fazer valer o desejo do analista, ou seja, o discurso do analisando como demanda, a transferência.

          Sei que parece contraditória a ideia de que o psicanalista não tem o domínio de dirigir o tratamento e ainda assim o dirige, de fato é!

          Para explicar tal contradição é necessário dizer que é a partir da transferência, pelo falar, pelo discurso do analisando, que é nos dado o índice para conduzir a análise e não pelo conteúdo ou teoria do psicanalista, é na medida em que o psicanalista é capaz de se esvaziar de si mesmo, que fará com que ele possa escutar o analisando.

          Se o psicanalista nasce no divã — como supus no início deste texto — é nele também que ele amadurece, na medida em que avança em sua análise pessoal e se aproxima do não ser e o quanto ele suporta se aproximar do real.

          Por fim concluo, que o psicanalista vai com seu analisando até onde ele foi com ele mesmo em sua análise pessoal. Um psicanalista nasce a partir do seu discurso no divã, mas se esvazia de si mesmo para ocupar a função, como dito neste texto não se trata de ser, mas de abrir mão de ser.

          Penso que o setting é um local de afetos e que o psicanalista ocupa a posição de função, mas não deixa de levar consigo ainda que inconsciente o sujeito que também se vê a partir do outro, penso que esta seja a diferença entre a psicanálise e outras abordagens, porque se não se trata do ser ou do saber do psicanalista, o que faz a minha prática hoje e manejo como psicanalista é o SENTIR.

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Kelly Ruivo, graduada em Administração pela UMESP, estudante de psicanálise pela Escola de Psicanálise de Curitiba, Turma 16.

4 Comments

  1. Gustavo Pereira

    Maravilhosa a reflexão parabéns

  2. Joselita Cármen Alves de Araújo Nobre

    Excelente texto!

  3. Johnny Caldeira

    Excelente texto, ótima reflexão, me faz pensar entre outras coisas no amor, em seu sentido amplo, pleno, que, acontece de dentro para fora e não no sentido contrário . Obrigado por dividir conosco.

  4. Evandro

    Kelly excelente , muita clara sua perspectiva.

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